terça-feira, 12 de novembro de 2019

Descobrindo a estreita relação entre a microbiota intestinal e vaginal

Na última década frases de grande impacto sobre a relação entre a microbiota intestinal e vaginal têm chamado atenção em trechos de artigos científicos publicados em revistas de alto impacto sugerindo a existência da microbiota intestinal como reservatório da microbiota vaginal para uma grande quantidade de micro-organismos (REED et al, 2000; AILA et al, 2011; WIJGERT et al, 2014; CASTRO et al, 2015; JANDHYALA et al, 2015; GONÇALVES et al, 2016; SOBEL, 2016; KANG et al, 2017; YADAV, VERMA, CHAUHAN, 2017).


            Fazendo uma busca mais refinada na literatura é possível encontrar diversos artigos, que corroboram com o fato de que esta hipótese é verdadeira (ANTONIO et al, 2005; EL AILA et al, 2009; MARRAZZO et al, 2009; EL AILA et al, 2011; GUSTAFSSON et al, 2011; DOBRUT et al, 2018). Um marco histórico precisa ser ressaltado, um artigo intitulado “RECURRENT VAGINAL CANDIDIASIS, IMPORTANCE OF AN RESERVOIR”, dos autores MILES, OLSEN AND ROGERS, publicado em 1977, no Journal America Med. Association (JAMA), cujo fator de impacto é 51.273 (2018), jornal este de relevância mundial para a ciência até hoje.
            Este trabalho descreve pela primeira vez a presença de Candida spp. isoladas de ambos os sítios anatômicos de um mesmo paciente, vagina e reto. Na publicação essa coexistência do mesmo micro-organismo foi descrita com cem por cento de correlação positiva para a presença de Candida spp. em ambos os locais, e os autores referem que estes resultados foram encontrados em 47% dos 98 pacientes arrolados na pesquisa, todos estes pacientes apresentaram cultura positiva em swabs vaginal e retal. Embora a cultura de fungos, à luz do conhecimento atual apenas identifique o gênero Candida, necessitando de mais testes e metodologias laboratoriais para o identificar a espécie fúngicas exata, é inegável a fantástica ideia científica e indubitavelmente um grande marco para o diagnóstico laboratorial disponível na época. Esse feito é tão importante que atualmente, cerca de quatro décadas depois, ele continua a inspirar pesquisadores do mundo todo a provar esta hipótese com as metodologias usuais.
            Na era do sequenciamento de terceira geração (NGS ou NextGENe), e do sequenciamento das microbiotas de vários sítios anatômicos e da identificação precisa de inúmeros micro-organismos, sem falarmos da possibilidade do emprego de técnicas e metodologias atuais como o FINGERPRINT, é perfeitamente plausível comprovar a hipótese de qual é a origem da Candida vaginal de um paciente, será de fato igual a intestinal?
            Nesse universo de tantas possibilidades diagnósticas, para que serve e o que é um FINGERPRINT? É um conjunto de técnicas moleculares que quando combinadas possuem muitas aplicações na ciência, sendo a mais importante delas permitir a identificação de micro-organismos homólogos que habitem sítios anatômicos distintos, através do DNA.
            À luz do emprego de Fingerprint e técnicas associadas, pelo menos duas publicações em revistas de indexação internacional relevantes validam e ratificam a hipótese, Abdullah El Aila et al (BMC Infectious Diseases, 2009) e Marrazzo et al (J Infect Dis, 2009), ambos avaliaram homologia de espécies de Lactobacillus spp. de origem vaginal e retal, e concluíram após o emprego da metodologia, que se tratava do mesmo micro-organismo, confirmando que a reserva vaginal de fato é o reto (ou intestino).
            Diante de comprovações científicas reais não podemos negligenciar conhecimentos já evidentes e dos quais não devemos esquecer, se quisermos manejo clínico eficiente e pacientes tratados que evitem disseminação e compartilhamento de micro-organismos, que cada vez mais estão associados em biofilmes polimicrobianos refratários a tratamento medicamentoso usual e recomendado em guidelines, precisamos enxergar diagnóstico laboratorial eficiente e nos conscientizamos que se faz necessário empregar novas estratégias combinadas, como ações farmacológicas e não farmacológicas que de fato resultem em eficiência terapêutica. Além de considerar a coexistência e sobreposição de patologias antes impensadas como de aparecimento conjunto.




Para não esquecer e praticar:


         Candida spp. causando CVV tem como reservatório o reto, não podemos ignorar a avaliação intestinal de pacientes recorrentes;
         A boca também é um reservatório extravaginal importante;
         Sexo oral, anal e com participação de dígitos, ou modalidades sexuais combinadas desprotegidas ou com múltiplos parceiros disseminam bactérias causadoras de vaginose bacteriana (VB) e promovem compartilhamento de espécies de Candida entre indivíduos;
         Casais homossexuais e heterossexuais monogâmicos ou não, compartilham microbiota entre parceiros e entre sítios anatômicos;
         O reto além de ser reservatório de Lactobacillus spp. também é reservatório de outras bactérias que causam VB e de Candida spp.
         E Lactobacillus crispatus é a principal espécie bacteriana predominante na vagina e reto em indivíduos saudáveis.