Na última década frases de grande impacto sobre a relação entre a microbiota intestinal e vaginal têm chamado atenção em trechos de artigos científicos publicados em revistas de alto impacto sugerindo a existência da microbiota intestinal como reservatório da microbiota vaginal para uma grande quantidade de micro-organismos (REED et al, 2000; AILA et al, 2011; WIJGERT et al, 2014; CASTRO et al, 2015; JANDHYALA et al, 2015; GONÇALVES et al, 2016; SOBEL, 2016; KANG et al, 2017; YADAV, VERMA, CHAUHAN, 2017).
Fazendo
uma busca mais refinada na literatura é possível encontrar diversos artigos,
que corroboram com o fato de que esta hipótese é verdadeira (ANTONIO et al,
2005; EL AILA et al, 2009; MARRAZZO et al, 2009; EL AILA et al, 2011;
GUSTAFSSON et al, 2011; DOBRUT et al, 2018). Um marco histórico precisa ser
ressaltado, um artigo intitulado “RECURRENT
VAGINAL CANDIDIASIS, IMPORTANCE OF AN RESERVOIR”, dos autores MILES, OLSEN
AND ROGERS, publicado em 1977, no Journal America Med. Association (JAMA), cujo fator de impacto é 51.273
(2018), jornal este de relevância mundial para a ciência até hoje.
Este
trabalho descreve pela primeira vez a presença de Candida spp. isoladas de ambos os sítios anatômicos de um mesmo
paciente, vagina e reto. Na publicação essa coexistência do mesmo
micro-organismo foi descrita com cem por cento de correlação positiva para a
presença de Candida spp. em ambos os
locais, e os autores referem que estes resultados foram encontrados em 47% dos
98 pacientes arrolados na pesquisa, todos estes pacientes apresentaram cultura
positiva em swabs vaginal e retal.
Embora a cultura de fungos, à luz do conhecimento atual apenas identifique o
gênero Candida, necessitando de mais
testes e metodologias laboratoriais para o identificar a espécie fúngicas exata,
é inegável a fantástica ideia científica e indubitavelmente um grande marco
para o diagnóstico laboratorial disponível na época. Esse feito é tão
importante que atualmente, cerca de quatro décadas depois, ele continua a
inspirar pesquisadores do mundo todo a provar esta hipótese com as metodologias
usuais.
Na
era do sequenciamento de terceira geração (NGS ou NextGENe), e do
sequenciamento das microbiotas de vários sítios anatômicos e da identificação
precisa de inúmeros micro-organismos, sem falarmos da possibilidade do emprego
de técnicas e metodologias atuais como o FINGERPRINT,
é perfeitamente plausível comprovar a hipótese de qual é a origem da Candida vaginal de um paciente, será de
fato igual a intestinal?
Nesse
universo de tantas possibilidades diagnósticas, para que serve e o que é um FINGERPRINT? É um conjunto de técnicas
moleculares que quando combinadas possuem muitas aplicações na ciência, sendo a
mais importante delas permitir a identificação de micro-organismos homólogos que
habitem sítios anatômicos distintos, através do DNA.
À
luz do emprego de Fingerprint e técnicas
associadas, pelo menos duas publicações em revistas de indexação internacional
relevantes validam e ratificam a hipótese, Abdullah El Aila et al (BMC
Infectious Diseases, 2009)
e Marrazzo et al (J
Infect Dis, 2009), ambos avaliaram
homologia de espécies de Lactobacillus
spp. de origem vaginal e retal, e concluíram após o emprego da metodologia, que
se tratava do mesmo micro-organismo, confirmando que a reserva vaginal de fato
é o reto (ou intestino).
Diante
de comprovações científicas reais não podemos negligenciar conhecimentos já
evidentes e dos quais não devemos esquecer, se quisermos manejo clínico
eficiente e pacientes tratados que evitem disseminação e compartilhamento de
micro-organismos, que cada vez mais estão associados em biofilmes
polimicrobianos refratários a tratamento medicamentoso usual e recomendado em guidelines, precisamos enxergar
diagnóstico laboratorial eficiente e nos conscientizamos que se faz necessário
empregar novas estratégias combinadas, como ações farmacológicas e não
farmacológicas que de fato resultem em eficiência terapêutica. Além de
considerar a coexistência e sobreposição de patologias antes impensadas como de
aparecimento conjunto.
Para não esquecer e praticar:
•
Candida spp. causando CVV tem como reservatório o reto, não
podemos ignorar a avaliação intestinal de pacientes recorrentes;
•
A boca também é um reservatório
extravaginal importante;
•
Sexo oral, anal e com
participação de dígitos, ou modalidades sexuais combinadas desprotegidas ou com
múltiplos parceiros disseminam bactérias causadoras de vaginose bacteriana (VB)
e promovem compartilhamento de espécies de Candida
entre indivíduos;
•
Casais homossexuais e
heterossexuais monogâmicos ou não, compartilham microbiota entre parceiros e
entre sítios anatômicos;
•
O reto além de ser
reservatório de Lactobacillus spp.
também é reservatório de outras bactérias que causam VB e de Candida spp.
•
E
Lactobacillus crispatus é a principal
espécie bacteriana predominante na vagina e reto em indivíduos saudáveis.
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